Dificilmente se encontrará em Portugal património classificado pela UNESCO mais esquecido do que o Convento dos Capuchos da Serra de Sintra. Da mesma forma, muito dificilmente se encontrará no nosso país, e mesmo fora dele, património tão singular e importante na concreta explicação de uma certa forma de viver o cristianismo, fundada pelo Santo de Assis, e que encontrou em Portugal chão fértil para o seu florescimento.
O Convento dos Capuchos é um lugar de enorme importância histórica e patrimonial. E se por um lado é errado compará-lo, numa lógica competitiva com outros espaços igualmente classificados na paisagem cultural de Sintra, por outro lado importa afirmar que é precisamente essa lógica competitiva que tem conduzido a uma situação de permanente secundarização ad sua relevância.
No seio da PSML, o Convento será o "Parque" que menor relevância tem, no que diz respeito a receitas. De longe... E por isso tem sido esquecido - escondido, até - no contexto de uma política de gestão de espaços classificados que é muitíssimo discutível, e em alguns casos explicitamente incompetente.
Já lá vai o tempo em que se planeava para os Capuchos a sua conversão em unidade hoteleira... ainda bem! Mas se por um lado já não passa pela cabeça de ninguém transformar o cenóbio franciscano num qualquer hotel para as bolsas mais abastadas, por outro lado os problemas fundamentais do Convento subsistem, não se verificando - desde a chegada da PSML aos Capuchos - nenhuma obra digna de nota. Fez-se uma género de "lavar de cara" do espaço. Substituiram-se cortiças antigas. Arranjaram-se telhados, se não estou em erro. Nada mais...
O Convento é, no plano material, muito frágil. Os materiais de construção, que já passaram a prova do tempo ao aguentarem mais de 400 anos de invernos rigorosos, não são imperecíveis; a vandalização por parte dos frequentadores do Convento nas décadas de 80/90 foi profundíssima; o roubo privou o monumento de alguns elementos fundamentais do seu recheio, e o encolher de ombros das entidades competentes tem sido um traço comum às diferentes tutelas, materiais mas também espiritual (refiro-me ao Patriarcado, que será - salvo erro - a entidade soberana nesse domínio).
Acredito sinceramente que, se a ICOMOS/UNESCO fizessem um estudo minimamente aprofundado sobre a história dos Capuchos nos últimos anos, Portugal correria o risco de passar pela vergonha internacional de ver a Paisagem Cultural de Sintra ser ameaçada no seu estaututo de Património da Humanidade.
Os actos de profundo desrespeito pelo Convento foram demasiados. A destruição do espaço, e má gestão material, o desrespeito pelo seu espírito inicial bem como pela memória do lugar foram repetidos por quase todos aqueles que ali tiveram uma palavra a dizer...
Recorde-se, apenas como exemplo, a forma criminosa como se construiu o Parque de Estacionamento anexo ao Convento. Ou para que não se pense que é "caso único", o inacreditável arranjo/ajardinamento do espaço fronteiro ao Terreiro das Cruzes, onde se encontra o "lago" artificial...
No interior do Convento persiste a ausência das imagens de arte sacra há muito tempo retiradas, supostamente para restauro. Estarão em restauro há todos estes anos?
Desde 2007 a afronta à Memória do Lugar tomou novo rumo: as Tapadas adjacentes ao Convento foram arrasadas pelo abate não proporcionado nem selectivos de árvores. A PSML tentou explicar o seu propósito invocando o perigo de incêndios, ou a necessidade de combater as espécies infestantes, mas como quem não quer a coisa lá foi acrescentando que a intervenção prevê " um conjunto de arranjos para áreas de lazer, que também serão construídas na Tapada D. Fernando II" (declarações de Jaime Ferreira ao Alvor de Sintra, 20/08/2007).
A intenção de criar nos Parques zonas para actividades de lazer não é nova... houve em tempos - e provavelmente haverá agora - quem defendesse que a Tapada do Mouco deveria ser transformada numa área de prática desportiva, com circuitos BTT, zonas de escalada, etc. Pelos vistos o projecto alarga-se (ou passa para) aos Capuchos e à Tapada D. Fernando II.
É por todos estes motivos, e por outros que este blog abordará num futuro próximo, que surge o SOS Capuchos, uma iniciativa pessoal aberta à ajuda e contribuição de todos. O denominador comum deverá ser uma ideia de preservação do Convento dos Capuchos, que passe pela sua recuperação, bem como pelo respeito relativo à história, ao espírito e à memória do lugar.
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